Odiava ir ao dentista. Muito mais do que os aparelhos, os ferros, os cortes e o motor, muito pior que o motor era a espera.
27 anos, workaholic, auto-crítico, inteligente e - justamente por isso - uma relutância muito grande para compreender que é bonito. Os inteligentes e feios são mais bem aceitos socialmente e por eles próprios, a inteligência sendo espécie de compensação pela falta graça. Ele não, sofria para aceitar o rosto de garoto e o sorriso simétrico, lindo e largo que surgia por trás dos óculos. Uma dor de dente filha da puta. Quanto tempo mais?
O Iphone sem bateria, o notebook no carro. Vai que ele me chama enquanto eu vou lá pegar? Preferiu esperar. A gorda que esperava pela vez, sentada à sua frente, folheava uma revista popular. Não conhecia o nome, não sabia do conteúdo, na posição que estava só conseguia ver a capa.
Dessas de novela, sabe? Vermelhas e com letras garrafais em amarelo, sabe? Sabe, com o mocinho que sofre na capa?"Simetria de uma Vida, último capítulo: Tarcísio Carlos Manuel Filho diz pra Luiz Alcantara as suas intenções com ele".
Tomara que morra, esbravejou sem paciência. Desistiu da consulta e saiu: pior que dor de dente, só o núcleo gay da televisão aberta.